Dunshee de Abranches: Zico revela problemas pessoais com presidente do Flamengo

O cenário rubro-negro foi marcado, no último domingo, pelo anúncio do falecimento de Antônio Augusto Dunshee de Abranches. Aos 88 anos, o ex-presidente do Clube de Regatas do Flamengo, o único a conquistar o título mundial na história da instituição, encerrou sua jornada após uma longa luta contra a doença de Alzheimer. A notícia reverberou, provocando manifestações e reflexões sobre um dos períodos mais gloriosos e, ao mesmo tempo, controversos do clube.

Entre as vozes que se manifestaram, a de Zico, o maior ídolo do Flamengo , trouxe uma perspectiva singular. Em suas redes sociais, o Galinho expressou seu pesar, mas não hesitou em abordar a complexidade de seu relacionamento com o dirigente. "Hoje Deus levou um grande ex-presidente do Flamengo . Que ele descanse em paz e Deus conforte os familiares. Tive problemas pessoais com ele, mas reconheço a importância dele para nossa geração", declarou Zico, em um depoimento que mescla luto, reconhecimento e a lembrança de atritos passados.

Advogado e visionário dirigente esportivo, Dunshee de Abranches gravou seu nome na memória flamenguista ao assumir a presidência em 1981, ano que se tornaria o mais vitorioso da trajetória rubro-negra. Sob sua liderança, o Flamengo alcançou o ápice, levantando as taças da Copa Libertadores da América e do Mundial Interclubes, este último com uma vitória histórica sobre o Liverpool em Tóquio. Tais conquistas não apenas imortalizaram a geração de craques como Zico, Júnior e Leandro, mas também consolidaram um padrão de excelência.

O Legado de Glórias e a Sombra da Controvérsia

A gestão de Dunshee, embora eternizada pelas vitórias, não esteve isenta de turbulências. Sua saída do cargo, em 1983, foi precipitada por uma intensa pressão vinda da torcida. O estopim para essa insatisfação popular foi a decisão de vender Zico para a Udinese, da Itália. Embora a negociação fosse justificada pela delicada situação financeira do clube naquele momento, ela representou um corte abrupto em uma administração que prometia ainda mais, encerrando seu ciclo de forma precoce e marcada por um profundo descontentamento.

Um dos capítulos mais notáveis de sua presidência, anterior à polêmica venda, foi a negociação para a renovação do contrato de Zico. Em maio de 1981, com 28 anos e já figurando entre os talentos mais cobiçados do futebol mundial, Zico era alvo de clubes europeus, como o Barcelona, que manifestava interesse em sua contratação, conforme noticiado pelo jornal "O Globo". Após um intrincado processo de negociações, o craque aceitou a proposta do clube carioca, que incluía um montante de 50 milhões de cruzeiros em luvas, a serem pagas de forma parcelada, e um salário progressivo ao longo do vínculo.

A Partida Inevitável do Ídolo e o Preço da Decisão

Contudo, a relação entre o ídolo e o presidente tomaria um rumo inesperado e doloroso. Em 1985, Dunshee de Abranches concretizou a venda de Zico para a Udinese por 2 bilhões de cruzeiros. A notícia chocou a torcida rubro-negra, gerando uma onda massiva de protestos e indignação. A transação, embora aprovada em uma reunião do Conselho Deliberativo, enfrentou considerável resistência interna. A imagem do dirigente, já fragilizada, foi alvo de caricaturas na imprensa, intensificando a pressão popular.

O peso da impopularidade e o desgaste político culminaram na renúncia de Dunshee de Abranches ao cargo em agosto, logo após uma humilhante derrota para o Botafogo. Assim, a gestão que trouxe o Flamengo ao topo do mundo terminava sob um clima de contestação, deixando um legado complexo: o de um líder que proporcionou as maiores glórias, mas que também tomou a decisão mais dolorosa e contestada pelos torcedores, a venda de seu maior expoente.